Perdi o sorriso… Não sei bem em que momento se escondeu, se foi numa manhã cinzenta ou numa dessas noites que se estendem até ao vazio da madrugada. Apenas sei que, ao procurar-me no reflexo do espelho, já não o encontro. Não há brilho nos olhos que o possa anunciar, nem a mais ténue curva nos lábios que o denuncie. É como se o tempo tivesse apagado a sua memória de mim, como se o vento o tivesse levado para longe, sem deixar rasto.
Vivo agora num mundo onde os dias
se atropelam uns aos outros, sem cor, sem textura, sem alma. Há uma monotonia
que se instala na carne, que me prende os passos e rouba o ar aos sonhos. Mas
que sonhos? Já nem me lembro da última vez que ousei fechar os olhos e imaginar
algo maior, algo diferente. Tudo o que outrora desejava desvaneceu-se, como
névoa ao toque do sol.
Caminho por esta existência como
quem atravessa um deserto infindável. A sede de sentido seca-me a garganta, mas
já não procuro um oásis. Aprendi a calar a esperança, a silenciar a sua
teimosia infantil. Era ela que me alimentava, e agora é o seu silêncio que me
consome.
Há uma melancolia que se agarra à
pele, uma tristeza que não grita, mas murmura, como um sussurro constante que
nunca cessa. Não é um grito de dor ou de revolta. É uma rendição tranquila,
como um rio que aceita a força da corrente. Deixei de lutar contra esta maré
invisível que me arrasta para parte alguma.
A vida tornou-se um palco vazio,
sem aplausos, sem testemunhas. Os sonhos, esses teimosos fiapos de luz, foram
sepultados sob o peso de um cansaço que não sei nomear. Não há lágrimas, não há
berros. Apenas o silêncio… esse silêncio denso que me envolve como um manto.
E no entanto, há uma réstia de
algo — talvez uma memória, talvez uma ilusão — que insiste em assombrar-me.
Recordo-me de um tempo em que o riso me habitava, em que o céu parecia infinito
e as estrelas sussurravam promessas. Será que um dia, mesmo num futuro
longínquo, encontrarei forças para voltar a procurá-lo? Será que o sorriso,
esse fugitivo esquivo, alguma vez voltará a ser meu?
Por agora, fico aqui, à deriva,
na espera tácita de algo que talvez nunca venha.